Para a 8ª Turma, o caso abrange questão constitucional sobre o direito da pessoa com deficiência

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho acolheu recurso de um enfermeiro da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) de Timon (MA), em pedido para reduzir pela metade sua jornada semanal para acompanhar filho com autismo em atividades terapêuticas. Por unanimidade, o colegiado entendeu que há provas suficientes da necessidade de atenção especial à criança pelo pai.

Condição especial

Na reclamação trabalhista, ajuizada em setembro de 2019, na 5ª Vara do Trabalho de Teresina (PI), o empregado informou que fazia escala noturna de 12 X 36 e pediu sua redução em 50%, sem compensação e sem comprometimento da remuneração, em razão da condição especial de seu filho de cinco anos, portador de Transtorno do Espectro Autista (TEA). 

O enfermeiro justificou a necessidade da redução por ter de realizar treino parental intensivo e acompanhar a criança nas atividades de terapia, fisioterapia e fonoaudiologia, além das consultas médicas. Argumentou, ainda, problemas psiquiátricos da esposa e dificuldades financeiras, “que provocam enorme sobrecarga e cansaço, sem o descanso reparatório”.

Falta legislação

Em contestação, a Ebserh sustentou que o enfermeiro não havia comprovado que sua jornada o impedia de oferecer à criança o acompanhamento necessário para seu desenvolvimento. A empresa alegou, também, ausência de legislação para amparar o pedido e disse que, como empresa pública federal, não se aplica a ela o regramento contido no Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis da União (RJU – Lei 8.112/1990).  

Prova cabal

O juízo de primeiro grau e o Tribunal Regional do Trabalho da 22ª Região (PI) indeferiram o pedido do enfermeiro. Segundo o TRT, é inegável que a criança deve ter atenção especial pelo pai, mas o enfermeiro teria de apresentar “prova cabal“ da necessidade de redução da jornada. A decisão se fundamentou no artigo 98 do RJU, que prevê o direito ao horário especial, sem compensação, ao servidor ou servidora que tenha cônjuge, filho, filha ou dependente com deficiência, “quando comprovada a necessidade por junta médica oficial”.

O TRT ressaltou que o enfermeiro trabalhava em outro hospital pela manhã, já com jornada reduzida, e que, na parte da tarde, a criança frequentava o ensino regular infantil.

Presença do pai

Ao recorrer ao TST, o enfermeiro explicou que seu pedido não tem como fundamento apenas poder acompanhar o filho nas consultas e terapias, mas a real necessidade da presença do pai no dia a dia, “principalmente orientando-o e conduzindo-o nas atividades e vivências diárias, uma vez que o acompanhamento familiar é fundamental para o desenvolvimento de um autista”.

Constituição

A relatora do recurso de revista, ministra Delaíde Miranda Arantes, entendeu haver provas suficientes da necessidade de atenção especial à criança. Segundo ela, o caso abrange a tutela de bens jurídicos destacados na ordem constitucional de 1988, “notadamente, o direito da pessoa com deficiência”. 

Em seu voto, a ministra ressaltou a Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (Decreto 6.949/2009) e lembrou que a jurisprudência do TST tem admitido a redução de jornada de empregada ou empregado público com dependente com deficiência, sem alteração remuneratória e sem compensação de horário, mediante a aplicação analógica do artigo 98, parágrafos 2º e 3º, do RJU. Todavia, ponderou que a pretensão depende da especificidade do caso, “não se tratando de uma decisão generalizável”.

A decisão foi unânime.

(RR/CF)

Processo: RR-1372-68.2019.5.22.0005 Fonte: TST